domingo, 17 de janeiro de 2010

A física e a metafísica do Comum

Ao contrário do que é habitual com as catástrofes naturais, tenho acompanhado o desastre haitiano com alguma atenção. a fragilidade do Estado haitiano a par do elevado grau de destruição de infraestruturas gerou uma situação social imprevisível. Liberto das amarras do Estado e da polícia vamos lá ver de que forma é que o Comum se manifesta no Haiti. Para já fala-se em saques e em grupos populares de vigilantes para combater os criminosos e ladrões. É acompanhar as cenas dos próximos capítulos.

Acrescento: o Bruno, pelos vistos, também se interessa pelo que se passa no Haiti.

7 comentários:

  1. Não sei quantas pessoas estão organizadas em milícias. Não sei quantas pessoas estão organizadas em gangues. Mas também não sei quantas são aquelas que gastam a pouca energia que têm a desenterrar pessoas que não conhecem de lado nenhum.

    PS - Se não sabes onde está o "comum", pergunta ao "habitus".

    ResponderEliminar
  2. Precisamente. O habitus é a história incorporada. É o que fica quando o Estado, a polícia e o mercado, isto é a história objectivada, vão ao ar. Não é homogéneo nem cai do céu. Não é Hobbes nem Rosseau. Não é wishfull thinking, nem é um conceito para enganar pategos. É um instrumento que nos ajuda a pensar a forma como a forma como aprendemos a viver, a pensar, a sentir e a agir nos impulsiona e o condiciona, mesmo que criativamente, nas novas condições com que nos deparamos.

    ResponderEliminar
  3. O problema não é o número dos que fazem isto ou aquilo. É a relação de forças entre elas, por um lado. É precisamente na manutenção dessas relações de poder, e do papel que o poder vai desempenhar neste processo de reconstrução (esperemos) que devemos pensar. Se a tanga do comum fosse séria, já estaríamos a ver o povo e as massas, libertas do Estado e do Mercado a auto-organizar-se e a reconstruir o país contra o capital e o estado, agora que os dois foram ao ar. Mais uma vez, o meu problema com o comum é que Ele só funciona na cabeça dos intelectuais COMUNistas e fora da história.Embora claro, eu também esteja a falar do comum só de ouvir falar. Nunca li nada sobre o assunto, mas como é evidente isso não é condição necessária para o rejeitar enquanto conceito, e não enquanto prática desejável.

    ResponderEliminar
  4. O habitus é um conceito. Abstracto como todos os outros. Consigo, tal como tu, observar práticas e defini-las de acordo com esta categoria. Das maneiras de falar, às maneiras de vestir.

    Tal como consigo observar práticas e encará-las como manifestações do comum. Por exemplo, um conjunto de técnicos informáticos que decidiu criar um sistema tipo linux, completamente gratuito. E cujo constante desenvolvimento passa pela acção voluntária de quem decide realizar upgrades na coisa. Aproveito também para te recomendar um excelente artigo sobre blogues, publicado num livro organizado por Diogo Ramada Curto. Aqui vai uma citação: "A emergência de novas vozes no espaço público, desligadas quase sempre dos poderes políticos, económicos e mediáticos permite a constituição de um espaço discursivo onde as prioridades e os enquadramentos dados aos fenómenos nem sempre correspondem aos modos habituais de olhar a realidade". Troca livre de opiniões, afirmação de subjectividades, construção de um espaço discursivo, fora da lei do capital e do estado. E muito wishful thinking, ou não estivéssemos a falar de sportinguistas.

    Dizer que é coisa para enganar pategos é um tanto ou quanto moralista. Para já não falar de ser uma coisa de intelectuais.

    O comum para existir não tem que ser dominante. Como se não existissem comunistas, sem comunismo. Como se não existissem sportinguistas.

    ResponderEliminar
  5. epá, essa foi baixa. foste tu que disseste à tarde que o comum era um sucedâneo de comunismo. Que servia para não assustar a caça. Portanto, para enganar pategos.
    Entretanto, e para me educar um bocado, estive a ler o Politics of the Common do Hardt. Um artigo em que o senhor me tenta explicar o que é o comum. Na versão minimalista consigo perceber o que é que o conceito significa, penso eu de que. Da mesma forma, acho que algumas das propostas do camarada também fazem sentido. Isto é, se enterdermos que toda a produção é socializada, mesmo sem entrarmos na biopolitica, e como sempre terá sido, embora com diferenças, como o próprio Hardt admite no artigo, a extensão do comum será uma forma de socialização dos meios de produção que dependerão cada vez mais de factores imateriais. Tudo bem. O meu problema é com o fetichismo do comum, se assim puder designar o fenómeno, ultrapassa em muito este entendimento comum do comum para tornar o comum em algo completamente incomum. Uma espécie de entidade ontológica pronta a ganhar vida no momento em que se liberte das grilhetas do estado e do mercado. O meu problema não é com a noção de comum, bastante mais antiga do que a utilização que Negri e Hardt lhe dão mas com a sua dimensão messiânica. Se quiseres chama-lhe Rousseaunina, se quiseres chama-lhe ontológica, se quiseres apelida-a de espontânea. Eu diria que o comum não brota do nada. Precisa de condições históricas para a sua pragmatização e não desabrocha mal o Estado ou o mercado desapareçam da área. bom isto está-se a tornar secante para o nosso único leitor, mas já ponho aqui umas gajas nuas. tornar comum o corpo incomum. eis um projecto.

    ResponderEliminar
  6. Absolutamente de acordo com os perigos do messianismo e do fetichismo. Em relação a tudo. O comum não é uma realização a acontecer depois do estado ou do capitalismo. O comum é o resultado de um conjunto de práticas que, per se, constituem uma esfera autónoma do estado e do capital. porque estes não são omnipotentes.

    ResponderEliminar
  7. Realmente o ser humano chega a ser muito estranho nessas horas. Enquanto alguns se solidarizam, outros partem para as pilhagens. O que nos resta é acreditar que um mundo melhor está por vir.

    ResponderEliminar